Por Mauro Fisberg
Nos últimos anos temos visto um aumento importante das deficiências de micronutrientes e vitaminas na população geral, especialmente pela diminuição da ingestão de frutas, verduras e legumes. Além disso, modismos, como a redução de uso do leite e derivados, por pretensos diagnósticos de intolerância à lactose ou alergia à proteína do leite de vaca, geram um volume enorme de pessoas com deficiência de cálcio e vitamina D. Esse metal e a vitamina contribuem de forma essencial para várias funções do organismo, como o crescimento dentário e dos ossos, mantendo a função cardíaca e a respiratória, entre outras. No adulto, especialmente na mulher pós-menopausa, a deficiência de cálcio está associada à osteopenia (redução do cálcio intraósseo) e à osteoporose (redução da densidade óssea por deficiência de cálcio, o que ocasiona fraturas importante, capazes de diminuir a qualidade de vida dos mais velhos).
A situação de alguns nutrientes no nosso País é bastante preocupante, especialmente porque vários trabalhos têm mostrado que a ingestão de vitaminas, especialmente as vitaminas A, C, D e E, e de alguns minerais, como ferro, zinco e cálcio, está abaixo das recomendações para o funcionamento adequado do organismo de crianças, adolescentes e adultos.
Seguramente, a globalização de costumes, com a importação de hábitos alimentares diferentes dos tradicionais de cada país, leva a modificações importantes do padrão de alimentação. Assim, diminuímos o consumo diário de arroz e feijão, a tradicional combinação do Brasil, das misturas e das frutas e verduras.
O custo dos alimentos, a variação de preços nos mercados locais, a dependência do tempo e da colheita e, especialmente, a falta de exemplos dos pais podem ser responsáveis por esse fenômeno. Mas não é possível dizer que a maior praticidade, o baixo custo dos alimentos prontos, o hábito de comer fora de casa e o maior acesso a alimentos de consumo rápido não sejam elementos que facilitem a ingestão de alimentos nem sempre mais adequados.
Em relação ao cálcio, enquanto tomamos leite, seja ele materno, de formulas lácteas ou de vaca, na idade pré-escolar precoce (até 4 anos), não temos problemas com este mineral. Em trabalho que realizamos com crianças de todo o Brasil, de norte a sul, em crianças de creches públicas e privadas, verificamos que mais de 85% das crianças alcançam as recomendações de cálcio nesta idade. No entanto, conforme elas vão ficando maiores, menos de 50% conseguem alcançar a quantidade mínima recomendada (três porções de lácteos por dia). Quando chegam à adolescência, verificamos que a maioria dos jovens não alcança o necessário. E isso é especialmente complicado, porque o período em que temos a maior absorção e aproveitamento do cálcio é justamente na faixa etária entre 15 e 25 anos.
Nos adultos, a situação é bastante semelhante, com poucos brasileiros ingerindo o que precisam. Em um outro estudo de nosso grupo e de pesquisadores da Faculdade de Saúde Publica da Universidade de São Paulo (o estudo ISA), e em vários outros, feitos em todo o País, pela Faculdade de Farmácia da mesma universidade, a quantidade de cálcio não chega a 600 mg, em média, quando na verdade precisaríamos de um mínimo de 1000 mg por dia, para o bom desenvolvimento dos nossos ossos e do funcionamento de nosso organismo.
Em relação à vitamina D, temos uma situação interessante. Temos duas grandes fontes desta vitamina para o ser humano. Uma parte é proveniente de alimentos, alimentos fortificados, vegetais, legumes e verduras; outra parte é sintetizada em nossa pele, pela ação dos raios solares. O Brasil é um país tropical, em que a maioria da população tem mistura de genes, e teria aproveitamento ótimo dos raios solares para a formação de vitamina D. No entanto, exatamente por estarmos muito expostos à radiação solar intensa, temos menor exposição, especialmente em crianças em idade escolar, e usamos protetores solares, que bloqueiam a formação da vitamina D na pele. Em alguns países, com a suplementação de vitamina D em leite e sucos, o risco de carências dessa vitamina diminui muito. Isso não ocorre no Brasil, em que a única idade em que realmente temos uma boa situação é no primeiro ano de vida, pela prescrição sistemática de vitamina A e D aos bebês pelos pediatras brasileiros. Com isso, houve uma diminuição gigantesca do chamado raquitismo por deficiência de vitamina D, com alterações das pernas e do esqueleto.
Mas mais tarde, com a diminuição do aporte de lácteos, acabamos ficando com uma alimentação inadequada em cálcio e vitamina D, o que tem levado a discussões sobre um aumento da quantidade de pessoas com alterações de exames de sangue, e orientações para um possível tratamento.
O uso de suplementos vitamínicos e minerais é uma possível solução, com estudos mostrando que os resultados não são excelentes, porque as pessoas não tomam os suplementos, e a adesão é pequena. Discute-se, portanto, a indicação de suplementar os alimentos com vitaminas e minerais. Vários países enriquecem produtos de uso em massa, como leites, com cálcio e vitamina D, assim como há a possibilidade de uso de iogurtes enriquecidos, queijos, sucos industrializados, em pó, e até águas. O resultado depende de custo, do uso contínuo, de não haver sabor inadequado e de que tanto a vitamina D quanto o cálcio sejam bem absorvidos. O importante é que a população seja informada, os resultados sejam medidos, e que o custo-benefício seja bom para quem toma.
Artigo escrito por Mauro Fisberg, pediatra e nutrólogo, professor Associado da Escola Paulista de Medicina – UNIFESP e coordenador do Centro de Dificuldades Alimentares- Instituto Pensi – Hospital Infantil Sabar
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